sábado, 31 de julho de 2010

Pequeno manual do degustador...

Abacaxi, banana, maçã, cassis. Aroma de vinho ou salada de frutas? Os adjetivos usados durante uma degustação são inúmeros. E não há exagero nenhum nisso. Antes do paladar, é o olfato que proporciona as primeiras impressões de um rótulo. “Frutado”, “vegetal” e “floral” são termos citados com freqüência. Mas há também quem garanta sentir “aroma de pêlo de porco da Borgonha”, “cassis maduro pisado” ou “pote de doce de pêssego recém-aberto” – expressões que passam contornos indefinidos soam engraçadas e, quase sempre, é apenas isso mesmo.
O certo é que os aromas são substâncias químicas voláteis percebidas no exame olfativo. Para descrevê-los, o degustador usa a comparação. Vai buscar no leque de referências olfativas uma ou algumas que o ajudem a expressar algo tão abstrato como um cheiro. Para não fazer feio, seja por falta, seja por excesso de expressões, preparamos um pequeno (e valioso) manual de instruções. São oito passos que o deixarão ainda mais confiante na hora de erguer um brinde, com a certeza de não estar pecando pelas palavras.
1. TRÊS GRUPOS DE AROMAS
São três grupos de aromas. Os primários (provenientes das uvas); os secundários (resultado da fermentação e do amadurecimento); e os terciários (que se formam no envelhecimento em garrafa). A maioria dos vinhos não tem capacidade de envelhecimento, sendo poucos os que desenvolvem aromas terciários. Essa transferência se dá quando milhões de leveduras transformam o açúcar das uvas em álcool. A levedura extrai esses compostos e revela esses aromas que estavam “escondidos”.
2. DUAS CENTENAS DE COMPOSTOS
Há mais de 200 compostos aromáticos identificados nos vinhos, responsáveis por notas frutadas, florais, herbáceas, animais e minerais. Nas uvas, há muitos componentes encontrados nos óleos de origem vegetal como, por exemplo, o linalol, o nerol, o limoneno. Esses elementos responsáveis pelos aromas florais e frutados também estão presentes nas flores e nas frutas cítricas.
3. VARIAÇÕES DO FRUTADO
Usar o termo frutado é uma forma abrangente (e correta) de identificar um vinho. Os de melhor olfato podem ser mais específicos e citar uma fruta em especial ou descrever como “fruta madura”, “fruta de bosque” ou “frutas frescas”. Ainda assim, o aroma é o frutado, mas a maneira como ele se apresenta no vinho pode ter formas variadas: pode ser mais ou menos maduro mais ou menos intenso.
4. CHEIRO DE CRAVO
Baunilha, caramelo, cravo são outros aromas encontrados na bebida de Baco, principalmente nos tintos e em alguns brancos. O aroma de baunilha é formado pela vanilina presente no carvalho. O eugenol, óleo essencial do cravo, é também encontrado nessa madeira. O amadurecimento em carvalho influencia o aroma, pois os óleos essências são transferidos para o vinho quando ele amadurece em barricas. O tipo de carvalho, o grau de tostagem e o período que o vinho fica estagiando no barril influenciam na intensidade e na qualidade do aroma.
5. AROMAS SECUNDÁRIOS
O aroma de manteiga (butterscotch), encontrados principalmente em vinhos brancos de uva Chardonnay, é originário da fermentação malolática – processo utilizado para transformar o ácido málico, mais forte, em ácido lácteo, mais brando. Esses aromas precisam de atenção, por isso são chamados aromas secundários.
6. AROMAS TERCIÁRIOS
Já os aromas terciários se desenvolvem na garrafa, no silêncio da adega. Reações químicas lentamente vão alterando a estrutura da bebida, modificando-a. Essa transformação afeta a cor e os aromas. Os vinhos passam a exalar aromas etéreos que remetem a tabaco, chocolate, ameixa seca. Os aromas primários já não existem e notas próprias do mel se tornam mais abundantes.
7. TREINO DE OLFATO
Para provar bem basta prestar atenção e ter algumas referências olfativas. Uma pessoa que não conhece o cheiro de jasmim, claro, não irá encontrá-lo no vinho. Quanto mais referências, quanto mais conhecimento sobre as uvas e suas características, melhor será o aproveitamento numa degustação.
8. SEM EXAGEROS
A discrição na descrição também é importante. Evite palavras rebuscadas ou referências particulares desconhecidas da maioria. Muita gente escorrega nos detalhes do vinho por usar linguagem exagerada e afetada que nada significa, a não ser puro esnobismo. Uma última sugestão. Não se prenda a modismos, seja genuíno, procure autenticidade e acima de tudo prove com prazer.

Autor: Manuel Luz
Fonte: Prazeres da Mesa Nº 59 – Maio 2008

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